A semente da criação pode dar uma belíssima história. A ideia é simples e, talvez por isso mesmo, surpreendente. O Cão Triangular começou em desenhos de Evelina Oliveira. E foi crescendo, pois assim são as ideias, até que a vida pictórica do animal pediu uma narrativa em palavras, isto é, o cão triangular pedia companhia. Maria Leonor Barbosa Soares abraça o projecto e explica às crianças a alquimia: «É por isso que é bom trabalhar em colaboração com outra pessoa. Aprende-se mais depressa, fazem-se coisas que não seríamos capazes de fazer individualmente e é muito divertido. A Evelina e eu sugerimos que experimentes também.».
Assim nasce uma história sobre a diferença e a amizade, contada pelo protagonista, um cão com corpo em forma de triângulo, «azul-turquesa de dia, fluorescente ao luar, que não parece assemelhar-se a seja o que for, bonito ou feio», que teve de aprender a gostar de si e a «aproveitar ao máximo todas as capacidades e qualidades» do seu corpo diferente do dos cães comuns. Nas andanças, o cão triangular acaba por encontrar um rapaz de cara triangular, sozinho, como ele, e conhecedor do medo pelas mesmas razões que ele. Um grande pássaro amarelo e hexagonal acaba por se juntar aos dois amigos e os três descobrem que a sua força triplicava.
Evelina Oliveira - que ilustrou, entre muitos outros, o Zé do Saco de Manuel Jorge Marmelo, Zeca Afonso, o andarilho da voz de ouro e A coragem do General sem Medo, ambos de José Jorge Letria - cria as ambiências de solidão, desamparo, tristeza, alegria e afago, enche as páginas de cor, movimento, expressividade e cumplicidade com os jovens leitores, como é seu apanágio.
Coloquial, Maria Leonor Barbosa conta, de forma simples, as vicissitudes do cão na demanda da felicidade, o espanto e o júbilo da descoberta de novos amigos, degraus da sua robustez, enceta diálogo directo com os leitores, estratégia que ora permite a identificação com as vivências dos miúdos que se sentem excluídos, ora veicula uma lição de carinho, compreensão e respeito pelos animais: «Foi um momento verdadeiramente extraordinário. Só então percebi como eu queria ter dono e como me tinha custado andar sozinho! Seria capaz de seguir aquele menino fosse para onde fosse... como um cão! Estavas à espera que eu dissesse outra coisa, não era? Mas não posso dizer melhor, acredita. Compreendi a minha realidade de cão naquele momento ou, dito de outra maneira, percebi o que queria da vida: uma matilha ou um humano em quem pudesse confiar e merecesse o meu respeito e que, por sua vez, me acarinhasse e respeitasse.».
O Cão Triangular, Evelina Oliveira e Maria Leonor Barbosa Soares; Campo das Letras, 2009
© Teresa Sá Couto
2 comentários:
As ilustrações são um espanto! Quem consegue resistir aos olhos do cão?
Abraço
Estes olhos que nos entram fundo são característica de Evelina Oliveira. E sim, estas ilustrações são obras de arte. Que maravilha ser criança outra vez :))))))
Abraço
T.
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