Editado no cair do ano de 2005, quando se concluiam as celebrações nacionais dos 650 anos da morte de Inês de Castro, «O Amor Infinito de Pedro e Inês» de Luís Rosa voltou a ser relançado, neste ano de 2009.
A Paixão trágica de Pedro de Portugal e Inês, que se transformou no mito que tem preenchido o nosso imaginário colectivo, devido à recriação literária de Camões ao cantar a história crua da «mesquinha que depois de morta foi rainha», tem neste romance uma nova porta exploratória: a porta grande da meditação sobre o amor e a loucura: «Não sei se se ama alguém com loucura, ou se se ama a loucura por motivo de alguém»; a porta da reflexão maior sobre o tempo e o seu compromisso com a palavra escrita: «O vento faz o seu caminho e o apaga na passagem. Só o homem tem sempre vontade de voltar ao impossível».
A Paixão trágica de Pedro de Portugal e Inês, que se transformou no mito que tem preenchido o nosso imaginário colectivo, devido à recriação literária de Camões ao cantar a história crua da «mesquinha que depois de morta foi rainha», tem neste romance uma nova porta exploratória: a porta grande da meditação sobre o amor e a loucura: «Não sei se se ama alguém com loucura, ou se se ama a loucura por motivo de alguém»; a porta da reflexão maior sobre o tempo e o seu compromisso com a palavra escrita: «O vento faz o seu caminho e o apaga na passagem. Só o homem tem sempre vontade de voltar ao impossível».
A história da «larga rua da vida» com memória perene inicia-se no dia da loucura, o dia de «terminação aziaga», 7 de Janeiro de 1355, dia da morte de Inês, a dama do «colo da garça». Sendo o amor trágico dos amantes a acção central da narrativa, a urdidura reconstrói a época com densidade psicológica e envolvência reflexiva: «Cada tempo tem os seus ódios próprios e as amizades convenientes. E também as suas coincidências. Branco e negro como o lado do ser e do seu oposto. Aquilo que o homem é. Um pequeno mundo onde se trava a luta do bem e do mal.». As lutas fratricidas pelo poder entre Castela e Aragão assombravam Portugal, agora por causa de Inês de Castro, nome maldito que iria enredar este país naquela «teia interminável». As analepses estruturam e explicitam o enredo. As prolepses definem-lhe o sentido futuro.
A desmesura de Deus e dos homens… Em torno deste episódio trágico pululam mitos e lendas que muitas vezes se sobrepõem à verdade histórica. Todavia, defende-se, «a lenda é o que fica da vida. E a própria vida é uma lenda que se vai amplificando para além da morte.». A narrativa aponta para um destino onde confluem a desmesura de Deus e a desmesura dos homens. Fala assim, o belo texto: «o amor é esse voejar incerto por um céu de fragilidades errantes. Nunca se sabe onde há mais horizonte aleatório, nem onde existe força para voar no espaço vacilante. Apenas se sente a liberdade de estar preso, e não ser capaz nem querer romper as cadeias de tudo e nada.»; «Às vezes, para descobrir a verdade basta abrir os olhos. Pelo caminho ficam os actos em pedaços. Só no fim do caminho longo se juntam os pedaços e se vêem à distância as cores da insensatez.».
Pedro decidiu viver o seu amor: «a vida é breve. A alma é extensa e vária. Vive-se de acordo com o modo que os outros querem ou segundo a escolha da sua própria construção. O viver? É essa a relatividade das coisas. Para Pedro a vida vivia-se desmesuradamente. A justa medida é apenas o modo de apaziguar o louco que há dentro de cada um. Só um grande amor entende os limites que não pode ter para ser grande.».
Pedro decidiu viver o seu amor: «a vida é breve. A alma é extensa e vária. Vive-se de acordo com o modo que os outros querem ou segundo a escolha da sua própria construção. O viver? É essa a relatividade das coisas. Para Pedro a vida vivia-se desmesuradamente. A justa medida é apenas o modo de apaziguar o louco que há dentro de cada um. Só um grande amor entende os limites que não pode ter para ser grande.».
Pedro, «rei excessivo, tão grande quanto infeliz», tartamudo, «temeroso em assuntos de transcendência», que fizera da justiça o ceptro da governação, neto de D. Dinis - o rei Trovador, o que teve a «premonição dos poetas e a epopeica visão do mar» -, e neto de Isabel de Aragão - a senhora que o povo fez santa -, deixava, além dos filhos de Inês, um filho de uma galega, Teresa Lourenço. Chama-se João, tal como o filho mais velho de Inês. Com seis anos, foi nomeado, Mestre de Avis, rodeado de monges e cavaleiros, «sob o olhar zeloso do D. Abade de Alcobaça, como se ali fosse o futuro do mundo». Era esse menino que perguntava se podia entrar pela «Porta do Mundo», Ceuta, o portal cobiçado. O tempo havia de «joeirar a escolha». O futuro histórico iria dar a resposta ao magnânimo menino e ao povo português.
«O rei Pedro de Portugal ia a caminho do fim dos seus dias. Caminhara em poucos anos um caminho longo e um amor infinito. De tudo o que era perene deixaria a lembrança desse grande amor e aquele menino, Mestre de Avis, a quem o destino sorria. Mas os homens que semeiam o futuro são assim. Um bocado de tudo e um pouco de nada. O excesso numa das mãos e a contenção na outra. O infinito é isso. O que existe e não existe, ao mesmo tempo.».
«A porta do mundo» de Luís Rosa
A narrativa ergue-se com uma prosa poética engenhosa, encantadora e encantatória, pejada de imagens, sons, cumplicidades: «porque não havemos de inventar palavras? Entendê-las pelo caminho dos sons e levá-las até ao limite, para ver se alargam o pensamento». É a emergência da criação, das palavras que «dentro de nós esperam para serem ditas». «Estranha coisa é o tempo que de vez em quando acorda e quer mostrar o tempo dos tempos», lê-se. Magnífica literatura esta que nos acorda as veias do tempo que nos compõe, acrescento. Ainda: «O tempo é como um livro de uma palavra só. Lê-se com todos os sentidos que contém ao virar das folhas. São as folhas que passam. Permanece o entendimento. (…) Restamos nós, interrogantes, rasto do que foi e é, à espera da palavra de amanhã.».
Conclua-se, então, que «O tempo é apenas uma aparência. O espírito sopra onde quer, quando quer. O que deve ser feito é que procura o tempo próprio. Não como os homens julgam. Imediato é o homem e a sua dimensão das coisas. Perene é o destino.». Perene será, certamente, a criação deste autor. Tal como Bartolomeu de Molianos o artífice que «prendia as almas» na pedra calcária branca e que esculpiu as narrativas do amor infinito nos túmulos de Pedro e Inês, em Alcobaça, também Luís Rosa, nascido em Alcobaça, deixa-nos esta narrativa de 195 páginas capaz de cinzelar muitas almas.
O Amor Infinito de Pedro e Inês, Luís Rosa; Editorial Presença, Lisboa, 2ª edição, 2009
(to Artur)
© Teresa Sá Couto
2 comentários:
É um livro inesquecível.Já o li há cerca de dois anos.A escrita é primorosa,bem lapidada,repleta de imagens que estimulam a nossa imaginação.Como vivo actualmente em Santarém,revivi alguns dos lugares relatados com emotividade.Revisitei o Mosteiro de Alcobaça e fui à Quinta das Lágrimas e ao Convento de Santa a Clara-a-Velha em Coimbra,o qual, embora em ruínas,é muito belo.É maravilhoso poder aprender e viver a História desta maneira.Agradeço.
Ma.Madalena A.Ribeiro da Silva Falcão
É um livro inesquecível.Já o li há cerca de dois anos.A escrita é primorosa,bem lapidada,repleta de imagens que estimulam a nossa imaginação.Como vivo actualmente em Santarém,revivi alguns dos lugares relatados com emotividade.Revisitei o Mosteiro de Alcobaça e fui à Quinta das Lágrimas e ao Convento de Santa a Clara-a-Velha em Coimbra,o qual, embora em ruínas,é muito belo.É maravilhoso poder aprender e viver a História desta maneira.Agradeço.
Ma.Madalena A.Ribeiro da Silva Falcão
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