quarta-feira, 18 de março de 2009

Dia Mundial da Poesia

A ciência desenha a onda; a poesia enche-a de água. - Teixeira de Pascoaes.

Quando um dia acabem os poetas...Há-de...ser tudo uma grande sensaboria. - Adolfo Casais Monteiro

Dia 21 de Março é o dia Mundial da Poesia. Sabe-se que, entre nós, as primeiras composições poéticas são anteriores ao séc. XII. Em Galaico-português, a alma encontrava a forma perfeita em versos melódicos e repletos de saudade. Falamos das cantigas de amigo que são, ainda hoje, um registo de verdade e emoção profundas. Os trovadores iniciavam, assim, a “saga maldita” da inquietação, porque a ousaram aliar à palavra. Nascia a poesia portuguesa.

Sem os poetas, teríamos chão seguro e paz nas veias. Então, porque buscamos exactamente o oposto? «Quando um dia acabem os poetas /há-de ser o mais belo dia deste mundo. /Hão-de cair do céu as divindades /sair do subsolo os medos e as sombras /reduzir-se ao tamanho natural /as coisas que eles aumentam e diminuem. /Há-de – não tenham dúvidas – /ser tudo uma grande sensaboria.» (Adolfo Casais Monteiro)

O que é a Poesia?

A poesia aparece-nos como uma negação: nega os lugares comuns, subverte a ordem das coisas, recusa o conhecido, procura o extraordinário: «A minha poesia é talvez esta luta contra paredes, muros e pedras – na tentativa de atravessá-los, em busca de um universo perdido…» (José Gomes Ferreira).

Na temática do amor, a negação surge como recusa da ausência, produzindo delírios encantados: «Agora, dormes, nua, /Sobre os lençóis – distante e ao mesmo tempo, aqui. /E essa réstia de lua /Vem da Lua, ou de ti?» (José Régio).

Sendo a descoberta a alavanca da inquietação, está criado o sangue e a correnteza que brotam do silêncio e alimentam a poesia: «eu quero a ânsia da onda/ o eterno rebentar da espuma» (Mia Couto); ou ainda, «O valor das palavras na poesia é o de nos conduzirem ao ponto onde nos esquecemos delas. O ponto onde nos esquecemos delas é onde nunca mais se pode ter repouso.» (Natália Correia).

A poesia é arroubo e êxtase. Para isso, surgem as antíteses: o sujeito elabora a poesia com lágrimas e risos, felicidade e dor, ódio e amor. Afinal, a Poesia é a Alma, com todos os seus recantos e labirintos: «Não, não posso adiar este abraço / que é uma arma de dois gumes /amor e ódio.» (António Ramos Rosa); «Anda sempre tão unido /o meu tormento comigo /que eu mesmo sou meu perigo. /E se de mim me livrasse, /nenhum gosto me seria; /que, não sendo eu, não teria /mal que esse bem me tirasse.» (Camões).

O Destino de Ser Poeta

Ser poeta é cumprir um estranho Destino: «Poeta sou! Cumpro o meu fado, estranho / Como o dum santo ou um louco: /Só posso dar de mais ou muito pouco, /Que é tudo quanto tenho.», e ainda, «Ser poeta é achar deleite /Nas suas próprias feridas. / Ai dos seios que dão leite /A bocas tão iludidas!» (José Régio)

Ser poeta é lançar um braço além-terra, sonhando a asa, para atingir um pássaro qualquer, ou "aquela voz" que não é voz, mais inflexão, interna, e secreta: «Enquanto na escola me ensinavam /a exactidão da bilha verde /para a minha boca/de-não-ter-sede... /...no papel que via? /Uma bilha torta /onde apodrecia /a água para a outra boca, /a secreta, /de sede intacta /no fundo da saliva. / E foi assim que me fiz poeta. / Com esta exactidão inexacta.» (José Gomes Ferreira)

Finalmente, diremos que ser poeta é, com «Voz activa», atirar sementes ao vento, ânsias e fomes, e congeminar o desassossego: «Canta, poeta, canta! /Violenta o silêncio conformado. / Cega com outra luz a luz do dia. /Desassossega o mundo sossegado. /Ensina a cada alma a sua rebeldia.» (Miguel Torga)


(dedicado a todos os poetas)


© Teresa Sá Couto

10 comentários:

jorge disse...

Para este seu arroubo poético de juntar vozes tão díspares, tão singulares e, ao mesmo tempo, paradoxalmente, tão uníssonas no elogio da loucura individual que é a poesia só tenho uma palavra - brilhante!

Teresa disse...

Obrigada, Jorge!
Fui na onda da rebeldia que é a poesia :)))

Um abraço
Teresa

José Alexandre Ramos disse...

Gostei muito deste artigo. Obrigado.

Teresa disse...

Obrigada!
O José Alexandre é um dos poetas a quem dedico o artigo.

Um abraço

Teresa

Luís Sampaio disse...

Dedicado aos poetas, aonde a Teresa se insere mas isso todos os atentos sabem.

Obrigado pelo texto extraordinário.

LS

Teresa disse...

Ó Luís...desculpe, mas, quanto muito, aspiro a aspirante... rsss
Todavia, obrigada pela sua generosidade :)))


um abraço
Teresa

Anónimo disse...

Gostei

Teresa disse...

:)
Bjinhos, Joni
T.

Maria Josefa Paias disse...

.
Gostei muito, Teresa.

Parabéns e beijinho :)

Teresa disse...

Beijinho, Josefa ;)